Medidas Automáticas de Intervalos no ECG
A importância dos valores dos intervalos característicos de um batimento cardíaco registrado num ECG é bem estabelecida de longa data. A nomenclatura PQRST foi introduzida por Einthoven no início do século XX e, entre muitas descobertas importantes, o QT longo começou a ser documentado e associado a situações clínicas em 1957.
Até a disseminação dos eletrocardiógrafos digitais nos anos 90, a tarefa da medição precisa dos intervalos era difícil e tediosa. Eletrocardiógrafos analógicos apresentavam sérias limitações devido ao atrito da pena com o papel, efeito da temperatura da pena nesse atrito e na espessura do traço, histerese excessiva e falta de precisão na velocidade de deslocamento do papel. Se não houvesse a aplicação de um cuidadoso ritual de calibração antes dos registros dos ECGs, a medição precisa dos intervalos era impossível.
A tecnologia digital resolveu as dificuldades de precisão e fidelidade dos registros e em seguida passou a abordar a questão da análise computadorizada do ECG. O primeiro e mais importante passo foi a realização das medidas de intervalos de forma automática.
A valiosa experiência então já acumulada pela Medicina era baseada em medições realizadas pelo discernimento humano – o grande desafio consistia em fazer com que as máquinas reproduzissem esse discernimento. Maior desafio ainda, era estabelecer um padrão para esse discernimento.
Em Junho de 1980 um grupo de especialistas, principalmente europeus, iniciou a busca desse padrão que resultou no trabalho “Common Standards for Quantitative Electrocardiography – CSE”.
Como resultado foi elaborada uma base com 250 ECGs nos quais as medidas foram realizadas por 5 especialistas reconhecidos e distintos. Os traçados incluiram:
– 32 ECGs normais
– 11 com IRBBB (Bloqueio incompleto do ramo direito),
– 18 RBBB (Bloqueio de ramo direito),
– 16 LAH (Hemibloqueio esquerdo anterior),
– 9 LBBB (Bloqueio de Ramo Esquerdo),
– 24 AMI (Infarto Agudo do Miocárdio),
– 19 AMI antigos (Infarto Anterior do Miocárdio),
– 21 PDMI (Infarto Postero-Diafragmático do Miocárdio),
– 13 LMI(Infarto Lateral do Miocárdio),
– 11MI (Infarto do miocárdio) com defeitos de condução,
– 22LVH (Hipertrofia do Ventrículo Esquerdo),
– 17 RVH (Hipertrofia do Ventrículo Direito),
– 10WPW ( Síndrome de Wolf-Parkinson-White),
– 42 casos de fibrilação atrial ouflutter
– 32 com extra-sístole ventricular e
– 6 com PE (embolismo pulmonar)
Das medidas realizadas pelos 5 especialistas sobre cada um dos traçados foram extraídos os valores médios e os desvios padrão que foram sugeridos como limites dos erros aceitáveis.
Esse trabalho teve grande reconhecimento e em 2003 a IEC (International Electrotechnical Commission) publicou a norma IEC-2-51:2003, que pela primeira vez especificou o desempenho mínimo dos eletrocardiógrafos incluindo os requisitos do estudo CSE, especificando os limites máximos de desvio da média e desvio padrão aceitáveis ao se medir automaticamente os
ECGs da base de referência:
A legislação sanitária brasileira torna obrigatório o cumprimento de normas de segurança IEC, neste caso através da norma ABNT NBR IEC 60601-2-51 de 2005, posteriormente incorporada na ABNT NBR IEC 60601-2-25 de 2014.
Em outras palavras, produtos que se proponham a realizar medidas de intervalos de forma automática só podem ser vendidos no Brasil se forem certificados por uma dessas Normas. Essa é a garantia que a legislação sanitária brasileira dá aos médicos de que essas medições apresentam a precisão dentro dos requisitos de segurança.
O eletrocardiógrafo TEB ECGPC foi certificado para obtenção automática de medidas de intervalos em 2013, seguido pelos eletrocardiógrafos C10+ e C30+ em 2014, tendo sido os primeiros (e até agora os únicos) eletrocardiógrafos produzidos no Brasil com essa certificação.
Além disso, possuem forma inovadora de apresentação dos resultados e de mecanismo de interação.
Abaixo temos a tela de medidas automáticas apresentadas pelos programas desses aparelhos. As 12 derivações são apresentadas simultaneamente e as barras de medição são posicionadas automaticamente pelo software. Os resultados aparecem no canto inferior esquerdo da tela.
O médico tem ampla facilidade de examinar os resultados, validá-los ou alterá-los de acordo com seu próprio discernimento.
Na forma impressa, também inovadora, uma apresentação condensada mostra a informação não só dos resultados como também em que derivação foi identificado cada ponto de medida:
Referências
[1] Jervell A, Lange-Nielsen F; Lange-Nielsen (July 1957). Congenital deaf-mutism, functional heart disease with prolongation of the Q-T interval and sudden death.Am. Heart J. 54 (1): 59–68.
[2] Macfarlane, Peter W, The Coming of Age of Electrocardiology – Comprehensive Electrocardiology – Vol. 1 – 2011
[3] JL Willems, P Arnaud, JH van Bemmel, et al.,Standards for quantitative electrocardiography: CSE Project phase one. KL Ripley (Ed.), Computers in Cardiology 1982, IEEE Computer Society, Long Beach, California (1982), pp. 69–74
[4] IEC 60601-2-51:2003 Medical electrical equipment – Part 2-51: Particular requirements for safety, including essential performance, of recording and analysing single channel and multichannel electrocardiographs
[5] ABNT NBR IEC 60601-2-51:2005 Equipamento eletromédico. Parte 2-51: Prescrições particulares para segurança, incluindo desempenho essencial, de eletrocardiógrafos gravador e analisador monocal e multicanal.
[6] ABNT NBR IEC 60601-2-25:2014 Equipamento eletromédico. Parte 2-25: Requisitos particulares para segurança básica e desempenho essencial de eletrocardiógrafos.